Quando nos referimos à primeira infância – do nascimento até os 6 ou 7 anos – talvez a primeira e principal preocupação dos pais é com a alfabetização dos seus filhos, entendendo-se aqui um estímulo e atenção ao seu desenvolvimento cognitivo. Porém, devemos entender a alfabetização como algo que vai além da aquisição de habilidades de leitura e escrita.
A alfabetização faz parte do campo das linguagens e, como tal, abrange outras formas de expressão, como as artes e o movimento corporal, por meio da execução de habilidades motoras. Ou seja, quando falamos de alfabetização devemos entendê-la como um processo mais amplo do desenvolvimento infantil. Assim, este texto tem por objetivo discutir os impactos que a ausência do desenvolvimento de habilidades motoras causa no desenvolvimento do repertório motor das crianças, levando ao surgimento do que chamamos de analfabetismo motor.
O que é Analfabetismo Motor
Podemos entender o analfabetismo como a falta de habilidades para o desenvolvimento da leitura e escrita, e por decorrência, a falta de habilidades para a expressão escrita e por conseguinte a oralidade. Assim, o termo “analfabetismo motor” descreve uma condição na qual indivíduos apresentam dificuldades em realizar habilidades motoras básicas e complexas, de forma eficaz e coordenada. Isso pode afetar diversos aspectos da vida cotidiana, como a participação em atividades físicas e esportivas, principalmente naqueles que envolvem controle e manipulação do corpo e de objetos, como esportes variados e mesmo atividades físicas como ginástica funcional, crossfit e outros. Impacta também na realização das brincadeiras e lazer, como pular corda, andar de bicicleta, ou mesmo nadar na sua forma mais recreativa. Além disso, tarefas cotidianas também podem ser impactadas, como subir e descer uma escada rolante, ultrapassar ou saltar de obstáculos, equilibrar objetos nas mãos e, até mesmo, dirigir um automóvel, o que irá exigir noção espacial e temporal, tempo de reação e coordenação motora.
Estratégias para superar o Analfabetismo Motor
Para superarmos o analfabetismo motor é fundamental criar uma consciência sobre a importância do desenvolvimento motor adequado desde a primeira infância, por meio da prática de habilidades motoras diversas e de forma frequente. Pais, familiares e profissionais ligados ao campo da educação e saúde devem estar cientes dos marcos do desenvolvimento motor e da importância de estimular habilidades motoras desde cedo. Devem conhecer e entender as fases do desenvolvimento motor, a partir dos movimentos reflexos e das habilidades rudimentares e fundamentais e compreender que a construção do repertório motor das crianças é determinada por três fatores: ambiente, tarefas e carga genética. Destes fatores apenas a carga genética do indivíduo não pode ser manipulada. Os outros dois aspectos podem e devem ser manipulados.
Assim sendo, as estratégias para a anulação do analfabetismo motor e estímulo da literacia motora, passam pela oferta de vivências e experiências com foco em abordagens lúdicas e brincadeiras, principalmente para as habilidades mais amplas como correr, saltar, desviar, rolar, arremessar e receber. O aprendizado por meio de jogos e da exploração ativa pode incentivar a aquisição das habilidades motoras de forma prazerosa e engajante. É importante encorajar um estilo de vida ativo desde a infância, fornecendo oportunidades para a prática regular de atividades motoras, físicas e esportivas, para além da educação física na escola. A participação em atividades diversificadas e o estímulo à prática regular podem contribuir para a anulação do analfabetismo motor e o desenvolvimento da literacia motora.
Superar o analfabetismo motor é um desafio que requer ações coletivas e compromisso de todos. Investir e oportunizar situações para o desenvolvimento da literacia motora desde a infância é fundamental para construir um repertório motor adequado e proporcionar oportunidades equitativas para todos. Ao reconhecer a importância das habilidades motoras e implementar estratégias eficazes, podemos capacitar indivíduos a se tornarem fisicamente competentes, confiantes e capazes de desfrutar de uma vida plena e saudável.
E como conselho final, “brinque muito como seu (sua) filho (a), saia das telas e valorize este tempo rico de construção de conhecimento e de sentimentos, os quais as crianças levarão para a vida toda”.